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Faz de Conta Entrevista: Daniel Rodrigues Aurélio
Posted by Bruna Fernandes
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19:12
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Faz de Conta Entrevista
Nesta primeira entrevista do Faz de Conta, tenho a honra de entrevistar o Daniel R. Aurélio, autor de mais de vinte livros, redator e editor desde 2002, editor das revistas "Conhecimento Prático - Filosofia", "Filosofia Especial", "Sociologia Ciência & Vida" e colaborador da "Leituras da História", todas publicadas pela Editora Escala. É bacharel em Sociologia e Política e pós-graduado em Globalização e Cultura pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
O Daniel foi super simpático em responder as perguntas. Ele tem um blog super legal também... é o Daniel Aurélio
Visitem!
Daniel escreveu seu primeiro original aos 17 anos
1- Daniel, você é autor de mais de vinte livros, porém existe algum que você destaca como preferido?
Eu poderia oferecer respostas prontas do tipo “Livros são como filhos, e não se classificam filhos por escala de predileção.O afeto é o mesmo por todos”. Ou então poderia fazer como certos autores que dizem: “O meu livro favorito está por vir”. Mas não vou ficar em cima do muro. Tenho um carinho imenso pelo meu primeiro livro, escrito aos 17 anos, quando narrei meus anos de adolescência com estrutura e ritmo de romance. O título é estranho e só meus amigos entendem seu significado (“Foi o que restou mesmo...”). Além do mais, são inúmeras as caneladas na gramática. Mas há nele uma pureza e até uma certa ingenuidade que ainda me comovem. Publiquei-o por um editora independente e espero, um dia, que ele apareça reeditado por uma editora mais estruturada.
2- Quais autores você indica para quem gosta de ler sobre história? E quais te influenciaram a ter gosto pela leitura?
Meu amor pela leitura vem desde Pedro Bandeira e Ziraldo até chegar a Fiódor Dostoiévski, Machado de Assis, Paul Auster, J.M Coetzee e Amós Oz. Depois do meu “romance-autobiográfico-infanto-juvenil”, parti para o campo da não-ficção, em especial nas áreas de ciências sociais e história. Sou formado em Sociologia e a guinada dos infanto-juvenis para os livros de história e sociologia foi consequência do meu repertório de leituras e pesquisas. Meus autores favoritos (e sempre indicados) na área de História são Peter Burke, Carlo Ginzburg, Robert Darnton e Norbert Elias, que é sociólogo mas também um grande historiador. Gosto muito também dos chamados “intérpretes do Brasil”, por eles realizarem um cruzamento entre a reflexão sociologica, o ensaísmo e a historiografia. Nessa linha, vale destacar os nomes de Caio Prado Jr., Sérgio Buarque de Holanda (pai do compositor Chico Buarque), Gilberto Freyre e Raymundo Faoro.
3- Como é feito, basicamente, o processo de escolha do tema e do material de consulta quando se pensa em escrever uma obra?
Meus livros na área de História são feitos quase sempre sob encomenda da editora. O assunto é sugerido pelo editor, baseado logicamente nas minhas áreas de especialização, com o objetivo de agregar informação histórica e pensamento sociológico com um texto leve e sem academicismos. A partir da pauta, inicio a consulta a bancos de dados em bibliotecas, acervos públicos e na internet. Por exemplo, quando escrevi sobre Getúlio Vargas, tive como fonte principal os arquivos online do Centro de Documentação Histórica da Fundação Getulio Vargas, guardiã de importantes documentos e relatos da Era Vargas. Faço também um levantamento bibliográfico criterioso sobre cada assunto. E tento processar todo esse universo em uma linguagem capaz de atingir um público amplo e diversificado. Esta última é, sem dúvida, a parte mais difícil. Escrever simples e com conteúdo é um desafio enorme.
4- Em “A Extraordinária História do Brasil”, você precisou dividir o assunto escolhido em três volumes. Você acredita que há uma responsabilidade por se tratar da história do país?
A divisão em três volumes (Brasil Colônia, Brasil Império e Brasil República) teve uma objetivo sobretudo didático. A responsabilidade é imensa, pois a possibilidade de erros em uma coleção desse porte é real. Um errinho na página 20 pode deflagrar a transmissão de uma informação incorreta para milhares de leitores. É preciso estar atento e ter a humildade de reconhecer falhas e publicar erratas. Como os livros da coleção tem um caráter interpretativo também, com a visão de historiadores, cientistas sociais e escritores, é necessário fazer o equilibrio de opiniões e mediá-las de forma educativa. Apesar das curiosidades, da redação por vezes bem-humorada, estou lidando com um material muito sério, que precisa ser respeitado.
5- O primeiro volume de “A Extraordinária História do Brasil”, fala do período pré-colonial até a proclamação da independência. É um assunto que ainda levanta questionamentos?
Sim. E muitos. Até porque a historiografia se renova constantemente e antigas “verdades absolutas” acabam derrubadas por novas pesquisas. Existem fatos e versões e eles são muitas vezes manipulados com finalidades políticas, tanto pela direita como pela esquerda. Na minha época de estudante, peguei ainda o finalzinho do sistema de ensino propagado pela ditadura civil-militar. Aquilo ali era uma história maçante e direcionada no sentido de construir mitos ao gosto dos donos do poder. E a esquerda acadêmica errou e erra muito também, quando coloca para escanteio certos temas e autores. A politização da história presta um desserviço ao país, embora seja perfeitamente viável que um historiador marxista ou liberal produza obras-primas utilizando seu arsenal teórico-explicativo com integridade. A preferência intelectuais e políticas de um autor, quando tratadas com bom-senso, não destroem a confiabilidade do material. Estou falando é das distorções grotescas praticadas por aí. E o período abordado nesse primeiro volume é repleto dessas versões.
6- Em ‘Segunda Guerra’, você analisa o assunto de forma pouco convencional. A leitura é bastante fluente. Existe alguma técnica de escrita que você utiliza para tornar o livro mais leve?
Um ex-professor, a título de elogio, disse admirar meu trabalho porque se trata de “vulgarizar o conhecimento acadêmico”. A palavra “vulgar” adquiriu um sentido negativo para as pessoas, mas ele está na verdade valendo-se do sentido preciso de “vulgarizar”: “Tornar popular e conhecido” e não “Tornar menos relevante e qualificado”, que é um outra forma de entender o termo. Eu tenho orgulho de popularizar aquilo que aprendi e aprendo na minha vida acadêmica. Quem pretende confinar o conhecimento atrás dos muros da universidade está, queira ou não, elitizando o saber. Eu escrevo simples, porque escrevo com a convicção de que meu leitor pode até ser iniciante no assunto, mas é inteligente, perspicaz, curioso e só precisa de um ponto de partida para aprofundar-se e abrir horizontes. A escrita fluente convida e é isso que faço: Convido o leitor para conhecer esse universo. Preste atenção e veja que cito autores e escolas de pensamento que supostamente seriam complexos para o leitor não-familiarizado. Mas recebo um retorno muito positivo. De certa forma, derrubo o mito de que a população só lê frivolidades. Nos meus livros cito Adorno, Nietzsche, Bourdieu, Freyre, Faoro etc. E o leitor vai em frente, cada vez mais interessado!
7- Por escrever sobre temas históricos, você acredita que o seu público pode acabar se tornando segmentado?
Sinceramente, não sei. Percebo que não possuo, digamos, um leitor padrão. O leitor de “Segunda Guerra” talvez não seja o mesmo daquele que leu “Dossiê Nietzsche”, por exemplo. De qualquer forma, a segmentação é, do ponto de vista mercadológico, uma tendência.
8- Seus livros possuem uma característica interessante: São de fácil acesso, devido aos preços populares e podem ser encontrados em banca. Como você analisa o cenário atual dos livros de banca?
Eu quero é ser lido. Então quanto maior os pontos de venda, melhor para a visibilidade dos meus livros. Os relatórios de venda são definitivos ao apontar que, na banca, a vendagem é muito expressiva. O Brasil, infelizmente, tem proporcionalmente poucas livrarias, mas bancas de jornal encontramos a cada esquina e elas de certo modo suprem uma demanda. Pela diversidade de obras que encontro em boas bancas, o leitor consegue montar ali a sua biblioteca de clássicos e temas gerais. Mas é claro que para qualquer escritor é uma maravilha ter seu livro exposto nas prateleiras de uma livraria respeitada. Tenho a sorte de conseguir, como autor, transitar por todos esses espaços.
9- Você acredita que há um interesse maior do público por livros de banca? Ou as livrarias ainda assumem um papel importante para o consumidor?
Livrarias, bancas, lojas de variedades e internet não são excludentes. Já encontrei livros excelentes em todos esses pontos. As bancas, em especial, me trazem uma resposta interessante em relação a vendas e repercussão dos leitores. Sei que existe preconceito por parte de alguns, de associar o “livro de banca” como algo menor. Existe um mercado específico para esse setor, um mercado rentável e concorrido, mas em geral o livro que circula na banca do Zé está também no catálogo da Livraria Cultura.
10- Que conselho você daria a um jovem autor que pretende se inserir no mercado literário?
O conselho é simples: ler e escrever, reler e reescrever. E principalmente ter autocrítica, pesquisar sobre livros de temática e segmento similar, ouvir conselhos, e não achar que tem na gaveta uma obra revolucionária. Ser publicado atualmente é muito fácil. Com uns R$ 500,00 você manda rodar uma tiragem pequena do seu livro, sem contar os meios alternativos propiciados pela internet. A questão não é ser publicado, e sim ser lido em meio a tantos títulos. Os gastos da população com os “produtos culturais” é limitado, em função de questões de natureza sócio-econômica, então, quanto maior a publicidade e a exposição, propiciada pelas editoras de médio e grande porte, melhor as condições de se tornar, enfim, lido. Mas é evidente que existem inúmeros casos de autores alternativos que se tornaram bem sucedidos a partir de edições em formato alternativo, quase artesanal. Sem falar nos blogueiros com reputação de ótimos escritores, antes mesmo de publicar em formato impresso. Para finalizar, acho que é preciso ter em mente que escrever exige concentração, disciplina – mesmo quando o texto, em si, é caoticamente criativo – e amor incondicional à palavra. Um amor capaz de resistir às más remunerações, à mira da crítica e aos percalços das atividades.
A Extraordinária História do Brasil
Dossiê Getúlio Vargas
'História contada de forma dinâmica.'